02/06/2009

Texto da Adriana Lara

Adriana Lara é aluna das aulas de dança contemporânea e está pesquisando um tema de livre escolha para trabalhar seu solo dentro da proposta de criação de um solo do grupo de formação, todas as sextas-feiras. Conversando sobre seu tema, uma coincidência. O texto do Fernando Pessoa que ela havia esolhido usa o termo "padrão". Daí elocubramos muito sobre o termo e suas significações , que em Fernando Pessoa se refere a um tipo de tótem, um marco que se coloca quando se "conquista" um território, como a bandeira dos Estados Unidos na lua, ou uma pedra fundamental na construção de uma cidade, ou qualquer marca que os navegadores / descobridores fincam e deixam na terra recém descoberta, num ato de apropriação e demarcação do lugar. Acabamos então falando muito sobre o espetáculo e a busca do nosso padrão. Adriana leu o blog e escreveu este texto inspirada em tudo que conversamos. Obrigada Adriana por mandar o texto. No final do texto, transcrevo o texto do Fernando Pessoa.


Senti um impulso de contestar o contestado....

Resgatando o meu padrão,

A minha repetição compulsiva, construída pelo caminho traçado de uma intenção consciente, no leito do inconsciente.

A minha vontade impulsiva, o meu desejo de ser, de ser forma, porém,
sem perder a consciência da impermanência desta mesma forma: como terra e água... vento e fogo...

Afinal somos muitos

Já fomos, estivemos, estamos e seremos.

Sempre ficando padrão para daí enfrentar novamente o mar de incertezas, perigos e abismos.

Procuro agarrar o meu padrão , neste momento, porque ele é meu tempo presente.

Parece simples, mas afinal, qual é o meu padrão nesse mundo vasto de estereotipias?

Sinto mais dificuldade de fincar o padrão do que deixá-lo. Sinto mais dificuldade de ser do que estar....

Como desmisturar? Sou geológica , sedimentada em Eras.

Meu padrão é a marca da minha obra e a minha bússola. É preciso reconhecê-lo para saber em qual direção seguir.

Porque seguimos sempre... sem parar ... o movimento perpétuo da vida...

"Este padrão signala ao vento e aos céus, que da obra ousada , é minha parte feita. O por fazer é só com Deus" Fernando Pessoa.




Padrão

O esforço é grande e o homem é pequeno.
Eu, Diogo Cão, navegador, deixei
Este padrão ao pé do areal moreno
E para diante naveguei

a alma é divina e a obra é imperfeita.
Este padrão signala ao vento e aos céus
Que, da obra ousada, é minha a parte feita:
O por fazer é só com Deus.

E ao imenso e possível oceano
Ensinam estas Quinas que aqui vês,
Que o mar com fim será grego ou romano:
o mar sem fim é portuguez

E a cruz ao alto diz que o que me há na alma
E faz febre em de navegar
Só encontrará de deus na eterna calma
O porto sempre por achar.



Mar Salgado

Oh mar salgado, quanto do teu sal
São lágrimas de Portugal!
Por ti cruzamos, quantas mães choraram,
Quantos filhos em vão restaram!
Quantas noivvas ficam por casar
Para que fosses nosso, mar!

Valeu a pena? Tuda vale a pena
Se a alma não é pequena.
Quem quer passar além do Bojador
Tem que passar além da dor.
Deus ao mar, o perigo e o abismo deu,
Mas nele é que espelhou o céu.


Fernando Pessoa

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