28/06/2009

Para Karla e Marcela....

Os gregos diziam que "os pés são as nossas raízes com a Terra, e os cabelos são as nossas raízes com o céu..."

O que atrai o olho

Essas fotos não passaram por qualquer efeito de photoshop. Não foram propositais.





Podem até ser consideradas um erro, falta de domínio da técnica de fotografia. Mas , elas me atraem o olho diferentemente.


Elas tem um poder de revelar algo que não é tangível, parecem fotos da minha memória, ou do que eu estava sentindo quando via essas cenas. Uma emoção ou um pensamento/reflexão...
Me lembram de quando coreografo. Eu imagino meio assim. Olho o movimento desse jeito. Embasso a visão de propósito pra ver outras coisas talvez... Me ajuda a não focar no que o olho atrai de imediato pois ele pode me trair... e ás vezes me prender na forma, no efeito, no detalhe . Ainda não sei bem, na verdade, porque uso esse recurso...

Enquanto escrevo pareço me contradizer, pois adoro a forma também! Mas ver assim parece me estimular... Me ajuda a fluir na hora da criação.... Desfocar pra ficar focada em outras coisas além do que já vemos, ou até na própria forma, mas de um outro jeito .

27/06/2009

sexta hora do almoço

Cansaço. Falta de paciência. Na aula de sexta na hora do almoço não queria pensar muito. Criação... "vou ter que pensar", achei que seria um sofrimento. Simplesmente transpuz minhas sensações. O que você sente num dia cansado de trabalho? Precisamos trabalhar... solte-se. Sinta e passe para o movimentar. Não julgue, não tensione o que não é. Fome. A hora é de dançar, o exercício passou. Há formas que não formam mas informam muito mais em sua incompletude. Não parece muito difícil SER. Maldito Shakespeare. Como explicar tantas imagens, sensações e estados... 30 minuto. Pessoas a minha volta pareciam vultos, não recordo vozes, mas os vejo. Sei que estão ali. Sei quando estão próximos. A música também, mas muitas vezes como pano de fundo, muitas vezes como um som qualquer, muitas vezes como motivador. Fui... não sei se bem, sei que sou e, pelo menos, fiquei bem ao fim.

26/06/2009

O fim de um início que não chegou numa metade..ainda..

O tornar visível ..Arte/Vida...A bola...Foram e são tantos conceitos criados e utilizados para um processo tão efêmero...Efêmero de sensações, de invenções, de superações....Cada dia um novo espetáculo, do zero, sem nada estruturado "contemporâneamente", e sim um espetáculo de verdades, ou como diria Ariane Mnouchkine "Ali, agora, rapidamente e verdadeiramente.." O autorretrato é isso, um diário movido de particularidades universais, de voyeur com sede de conhecer o outro para então conhecer a si. O outro-eu, o outro do eu, o eu. O autorretrato sou eu em você, é a luz, o chão, o suor, o aplauso duvidoso do que de fato é vida e o que de fato é arte, é o palco cheio de individualidades articuladas com vontade de gritar "Ei!Esse sou!"

Seja. Busque.

“Onde você está? Aqui. Que horas são? Agora. Quem é você? Este momento.”

(O caminho do guerreiro pacifico)


Pensando nisso que vejo o autoretratodinâmico. Sempre, ao menos alguns, buscam aprimorar-se de alguma forma. Seja acrescentando valores ou excluindo-os alguns.

A vida de alguma forma nos ensina a nos resguardamos. A respeitar uns aos outros. Até religiões definem como primórdio, o respeito ao próximo. Numa das mais populares - “Amaras o teu próximo como a ti mesmo”. Mateus 22:39. - e ao mesmo tempo, tão inóspita vida, nos confronta com dilemas substanciais e eloqüentes sobre nossa posição em relação ao mundo. Se seguimos as regras, somos caretas. Se o sistema, então somos manipuláveis e quadradões, se o inverso somos anarquistas ou “doidões”. Se seguimos nossa linha então afetamos ao outro por ser honesto por de mais. Se fizermos muito de alguma coisa ou somos muito criativos o jargão muda para sonhadores e utópicos. Você consegue ser o que você fala, digo, seguir seus ideais? Cumprir com seus planos, evitar o que reclama ou acha ruim?

Percebo sempre uma dificuldade de sermos o que acreditamos. Não em momentos específicos. Nessa hora é muito fácil, por um momento, nos esforçamos e plim: feito. O cotidiano que nos mata. Os pequenos problemas formam o alicerce para a catástrofe. Como um vírus que se instala inativo e no momento que seu sistema imunológico abaixa, ele ataca e se transforma numa grande doença.

E aí que, na nossa vida como ser humano racional, descobrimos o réu para nossa sentença. Culpado! E com um julgamento as pressas, o culpado se torna o sapato que escorregou na hora que você pisou na banana e caiu de cabeça no chão... e não porque estava estressado, falando ao telefone com a mulher que reclamava que havia batido o carro e você não sabia como iria buscar a criança na escola. Dificuldades adversas sempre tornam a vida mais vida. Testando-nos, colocando a gente em prova sobre o que pensamos e como agimos. A tendência a super-proteção nos faz excludentes e excluídos, e por conseqüência, nos torna individualistas. Como manter nossa individualidade e não sermos frios nesse paradoxo? Como não permitir que isso ocasione o cheque-mate dado pelo egoísmo? Até onde o respeito ao outro não tira sua individualidade? O meu mundo para onde começa o seu? Invasivo ou ser-mais-humano? Me pergunto por onde permeiam esses limites do que significa dar atenção e não dar, fazer pelo o outro e deixar de fazer para você, que resposta você tem disso, se precisa de resposta...

Não sei. Sei que respeito está em colocar-se no lugar do outro e pensar como isso te afetaria, também. Presto mais atenção em mim e se até o mundo gira entorno do seu próprio eixo, e de um astro maior, na dúvida, me mantenho em movimento. Sinto dança, sou dança e quando não danço me desespero e entristeço, por estar indo contra meu ser. Pior do que desrespeitar o outro é me desrespeitar (vivo sozinho?). A vida se faz no segundo seguinte, analisamos a história para entendermos a nós mesmos e buscarmos pisar com mais atenção. Sabe a estória de não repetir o mesmo erro, ou aprender com o erro alheio? Faça, porque a vida é feita do que se faz. Na dúvida, erre. Não tentemos nos julgar para adentrar a um crivo social. Dou conta do que for possível para mim, se não for me prepararei como puder. Não danço conforme a música. Danço conforme o que sinto da música.

25/06/2009



Where should we reach to find ourselves?

Tempo

O tempo voa. Sinto meu corpo se deteriorando.
Estou doente. Tudo doi. Corpo amolece.
Reflexo do que tem dentro talvez.
O tempo continua a passar.
Eu ando cansado.
Eu corro cansado.
Ando correndo cansado.
E o tempo só passa.
Em quem confiar. Como separar o íntimo, do social e do politicamente correto.
Quero correr pro tempo nao me pegar.
Mas eu ando tão cansado.

22/06/2009

Fotos dos bastidores (Aquecendo)
















Fotos da Luciana projetadas da temporada no Dulcina























































































































































QUATRO DANÇAS

ERA ESCURO E DESCONFORTANTE TANTA ANCIEDADE, NÃO SEI PORQUE ANCIAVA, MAS ANCIAVA COMO MARCELA E SUAS PEQUENINAS PERNAS SEGURAS E FORTES ALÍVIO, COMEÇA, QUATRO CORPOS DANÇANTES, COM LUZ ABERTA E CORAÇÃO LEANDRO DANÇA, MARCELA DANÇA, SILÊNCIO, JÁ NÃO HÁ INCOMODO JÁ NÃO HÁ SOFRIMENTO APENAS DANÇA, LEVE E FLUTUANTE FORTE E LINDO, SÃO LINDOS CORPOS EXPRESSIVOS QUE ME DESCONFORTAM E QUERO DANÇAR, L, LEANDRO, LINDO, BAILARINO DANÇADOR AMADOR DA ARTE, VIBRANTE, SURPREENDENTEMENTE, DANÇANTE O RAFA ENTRA E SALTA E ROLA E BRINCA E DANÇA EU DANÇO ANGÚSTIAS E ALEGRIAS, MINHAS SENSAÇÕES MANIPULADAS COM MAESTRIA PELA LUZ PELA COR PELO SUOR E O ROSTO DE RAFA E TUDO ALI ME MANIPULAVA O SOM DA TÁBUA VELHA DE DULCINA E DO AR VIBRANTE E PROVOCADOR SILÊNCIO SILÊNCIO AMOR POR AMOR MEDO POR MEDO GENTE POR GENTE, A TODA VELOCIDADE, LENTO. PASSAM POR MIM MATÉRIAS DE ARTE DE MEMÓRIAS DE CHEIROS DIVERSOS LEANDRO DANÇA RAFA ME OLHA MARCELA TIRA OS SAPATOS. DANÇAM DANÇAM DANÇAM ATÉ QUE ENTRA A INFINITA, ELA DANÇA LINDAMENTE ENORME E LANGUIDA E FORTE E KARLA, EU NÃO SABIA QUE ELA DANÇAVA ASSIM, E EU QUIS SER INFINITA ENTÃO E ELA DANÇOU E TODOS A VIRAM DANÇAR E MESMO QUANDO NÃO DANÇAVA ERA INFINITO, SEUS BRAÇOS E PERNAS E QUADRIS E O CABELO AH! COMO OS CABELOS DE KARLA DANÇAM MARAVILHOSAMENTE E ERAM SOLOS E DUPLOS E TRIOS DANÇANTES E CABELOS CASTANHOS CLAROS E ESCUROS DANÇANDO E CHORO, E O CORPO LINDO DE MARCELA DEITADA NO CHÃO RESPIRANDO... RESPIRANDO... RESPIRANDO... SEM SAPATOS SEM FORÇAS, COM MÚSICA, ESCURO, DEUS, POR FAVOR, NÃO DEIXA TER TERMINADO QUERO DANÇAR MAIS, LEANDRO DANÇA, RAFA DANÇA, SOM SOM SOM EU RESPIRO NOVAMENTE SILÊNCIO LUZ ABERTA, PEITO ABERTO PERFEIÇÃO EU TOCO AQUELE AR QUE TOCA AQUELES CORPOS DANÇANTES NO ESCURO EU OUÇO E VEJO E DANÇO ENTÃO EMOÇÃO A FLOR DA PELE QUANDO ELA DANÇA, INFINITA E COINCIDE COM A BATIDA, É LINDO CASUALMENTE, NÃO SEI SE PELA DANÇA OU PELAS LEMBRANÇAS OU PELA VONTADE DE DANÇAR... TALVEZ APENAS POR SER ARTE UMA EXPERIENCIA ASSIM FORTE, ASSIM VIBRANTE, ASSIM SINCERA E INFINITA...

GRATIDÃO!

ALICE DE HOLANDA

18/06/2009

Achados dramaturgicos em outras bocas.

Olha o que eu achei na internet...

"O senhor ... Mire veja : o mais importante e bonito do mundo é isto : que as pessoas nao estão sempre iguais , ainda nao foram terminadas – mas que elas vão sempre mudando. Afinam e desafinam. Verdade maior. É o que a vida me ensinou. Isso me alegra, montão."

Grande Sertão Veredas : João Guimarães Rosa

06/06/2009


Hoje tem espetáculo?


Tem sim senhor!!!!!!!


Na Mostra de dança XYZ!

Trecho do espetáculo Cidade em Plano.

E... Performance do Autorretratodinâmico com vídeodança idealizado por Rafael Villa





Dividimos o Foyer com outros artistas: Cris Oliveira de BH, Ary Coelho e a Companhia Margaridas do DF

Ás 19 horas no Foyer da Martins Penna. Entrada Franca!

04/06/2009

A dança do observador

Agradeço ao convite de publicar minhas impressões. Obrigado ASQ, obrigado LU
Espero estar contribuindo para nosso crescimento, buscas e realizações.

Esse texto é do início do processo criativo, dia 25/07/07. São minhas anotações assistindo aos ensaios com os bailarinos: LU, Robson, Marcela, Rafinha, Ju e Karlota.

Ele senta ela ostenta
olhai-vos quem transpira
O ar e o som reverberam
Uma brisa cheirosa nos alcança
Agora parece que circulamos em volta de nós mesmos
Somos ele, ela, eles e elas
NÓS
nos tocamos ao longe
talvez se busque uma distância
O frescor distante da memória
Ai meu Deus a palavra não dá conta
Hoje somos outros
A sala é de novo nova
O suor que ontem pingou já secara.
O ar e os suspiros já não povoam mais
Enfim se reencontraram
A outra paira, gira
hoje ela é ela
O ar é mais frio
Lembra daquela saudade?
finalmente um beijo cheiroso abafado em silêncio no som
Estarrecido
O espaço é povoado por um cheiro doce e leve
Longe do meu próprio olhar sublimo
Hoje o repertório de sensações é acrescido de novos movimentos
O hoje é o improviso livre do amanhã
Fiquei preso e não consigo sair
Memória de acalantos tenros
O que vem da memória é hoje o novo
Deitamos ao nos entreolhar
quando se toca o chão tocamos a nós mesmos
Sentir a dor de um peso leve
Expandir a musculatura ao fechar os olhos
Olhos fechados significam imagens
A textura do tecido que recobre a pele
o sentido do suor que não esgota e preenche a pele
É como se aquele grande cubo fosse um só para todos
como um aquário onde um suspiro ali transforma a água aqui
Uns ali outros aqui
Eu não seria capaz de pôr um fim
Como se dança o silêncio?
como se coreografa o movimento dos sinais nervosos?
Aqui podemos ser um só
De repente um profundo silêncio nos alcança, é quase surdez
É como gritar por dentro
É como morrer amparado pela superfície que nos toca
E como seria encontrar um fim?
É recomeçar tudo de novo amanhã
A Luciana fez som externo, pôs fim
É como atirar uma pedra no aquário
Não sei mais a diferença entre dança e alongamento
Nem mais uma palavra foi dita ali dentro.

Janelas de encontros

obrigado por abrirem as janelas dos seus mundos, 
Obrigado por permitir que adentremos em seus mundos, em seus sonhos, em seus medos...
ver de perto que podemos nos conhecer, nos sentir e nos ver pela nossa dança pessoal foi o melhor presente dessa noite de quarta feira dia 3 de junho de 2009.
O explícito do implícito.
Janelas abertas são as portas dos sonhos.

Projeto Três Olhares e Uma Dança




Confira o site da Mostra de Dança XYZ!
Saiu 2 críticas no Projeto Três Olhares e Uma Dança.
O terceiro olhar é do público, será que alguém vai escrever?
Vc pode participar desta iniciativa de dar voz ao público, é só escrever suas impressãoes e mandar para mostradedançaxyz@dancaxyz.com.br

COMO VC GOSTOU DO ESPETÀCULO?

Deixe aqui suas impressões!!!

Estreamos!



Sim, foi ontem. Já é passado. O tempo não pára. Novidade... Mas , é sempre intenso perceber isso e não podia deixar de falar... O gesto da Karlinha na foto no palco ontem é de vôo. Ainda estou voando... É adrenalina, expectativa, é tanto abraço no final, tanta energia... Fico sempre num estado diferente no dia seguinte....


Tem tanta coisa ainda pra escrever aqui no blog. Ele não está completo. E o espetáculo tb não! Nunca está. Isso tb é dinâmico. Quero ainda escrever sobre a trilha, a pesquisa com a tinta amarela, colocar alguns textos antigos, falar das decisões sobre a estrutura do espetáculo, etc , etc. Enfim... Estou com a síndrome do registro.... Quero registrar tudo. Estou curtindo essa fase de registro. Dá uma perspectiva outra do trabalho e a troca com quem lê é realmente incrível!


É impressionante e sei que tb é sabido e não é outra novidade de que a presença do público muda tudo. E que público! Foi bacana demais ver o rosto de pessoas que acompanham o trabalho, alunos , ex-alunos, família, amigos, amigos dos amigos, artistas da dança de Brasília, estranhos, todo mundo junto ali na estréia... Queria agradecer em público, mas não o fiz ontem pois não cabia na concepção do espetáculo, eu ir lá na frente e falar isso.... Então, aqui eu posso! Obrigada pela presença!!!!


Quero falar da estréia, mas agora não dá tempo. Ainda temos uma apresentação pra fazer dentro do festival.... Estaremos apresentando uma performance do autorretratodinâmico e um trecho do outro espetáculo da companhia, chamado Cidade em Plano, no sábado na Martins Penna ás 18.30, entrada franca!

Continuamos então...

Estamos programando uma nova temporada já pro outro final de semana! Aguardem !

02/06/2009

Texto da Adriana Lara

Adriana Lara é aluna das aulas de dança contemporânea e está pesquisando um tema de livre escolha para trabalhar seu solo dentro da proposta de criação de um solo do grupo de formação, todas as sextas-feiras. Conversando sobre seu tema, uma coincidência. O texto do Fernando Pessoa que ela havia esolhido usa o termo "padrão". Daí elocubramos muito sobre o termo e suas significações , que em Fernando Pessoa se refere a um tipo de tótem, um marco que se coloca quando se "conquista" um território, como a bandeira dos Estados Unidos na lua, ou uma pedra fundamental na construção de uma cidade, ou qualquer marca que os navegadores / descobridores fincam e deixam na terra recém descoberta, num ato de apropriação e demarcação do lugar. Acabamos então falando muito sobre o espetáculo e a busca do nosso padrão. Adriana leu o blog e escreveu este texto inspirada em tudo que conversamos. Obrigada Adriana por mandar o texto. No final do texto, transcrevo o texto do Fernando Pessoa.


Senti um impulso de contestar o contestado....

Resgatando o meu padrão,

A minha repetição compulsiva, construída pelo caminho traçado de uma intenção consciente, no leito do inconsciente.

A minha vontade impulsiva, o meu desejo de ser, de ser forma, porém,
sem perder a consciência da impermanência desta mesma forma: como terra e água... vento e fogo...

Afinal somos muitos

Já fomos, estivemos, estamos e seremos.

Sempre ficando padrão para daí enfrentar novamente o mar de incertezas, perigos e abismos.

Procuro agarrar o meu padrão , neste momento, porque ele é meu tempo presente.

Parece simples, mas afinal, qual é o meu padrão nesse mundo vasto de estereotipias?

Sinto mais dificuldade de fincar o padrão do que deixá-lo. Sinto mais dificuldade de ser do que estar....

Como desmisturar? Sou geológica , sedimentada em Eras.

Meu padrão é a marca da minha obra e a minha bússola. É preciso reconhecê-lo para saber em qual direção seguir.

Porque seguimos sempre... sem parar ... o movimento perpétuo da vida...

"Este padrão signala ao vento e aos céus, que da obra ousada , é minha parte feita. O por fazer é só com Deus" Fernando Pessoa.




Padrão

O esforço é grande e o homem é pequeno.
Eu, Diogo Cão, navegador, deixei
Este padrão ao pé do areal moreno
E para diante naveguei

a alma é divina e a obra é imperfeita.
Este padrão signala ao vento e aos céus
Que, da obra ousada, é minha a parte feita:
O por fazer é só com Deus.

E ao imenso e possível oceano
Ensinam estas Quinas que aqui vês,
Que o mar com fim será grego ou romano:
o mar sem fim é portuguez

E a cruz ao alto diz que o que me há na alma
E faz febre em de navegar
Só encontrará de deus na eterna calma
O porto sempre por achar.



Mar Salgado

Oh mar salgado, quanto do teu sal
São lágrimas de Portugal!
Por ti cruzamos, quantas mães choraram,
Quantos filhos em vão restaram!
Quantas noivvas ficam por casar
Para que fosses nosso, mar!

Valeu a pena? Tuda vale a pena
Se a alma não é pequena.
Quem quer passar além do Bojador
Tem que passar além da dor.
Deus ao mar, o perigo e o abismo deu,
Mas nele é que espelhou o céu.


Fernando Pessoa